O início do calendário eleitoral pode atrasar ainda mais a precificação do carbono, mas o sócio do Graça Couto Advogados, Guilherme Leal, diz que há chances de aprovação do PL este mês
20 de junho de 2024
Mariza Louven
Só se for agora. Senão, dificilmente a aprovação do projeto de lei que institui o mercado regulado de carbono no Brasil ocorrerá ainda este ano, na avaliação do advogado Guilherme Leal, sócio do Graça Couto Advogados. Junho é o mês do meio ambiente e também antecede o início do calendário eleitoral, uma janela de oportunidade para o tema voltar a ganhar a atenção do legislativo, atualmente mais dedicado a outras prioridades como a reforma tributária.
“Existe uma expectativa de que esse projeto seja pautado ainda este ano, possivelmente este mês. Não sei se esta pode ser uma visão extremamente otimista, mas o contexto de um mês do meio ambiente e a janela de oportunidade pré-calendário eleitoral parece sugerir ou recomendar uma atenção específica para o tema, para que a gente não perca uma oportunidade de ter essa matéria ainda este ano. É difícil afirmar e cravar com certeza, mas, do contrário, o tema tende a ser empurrado mais para a frente, possivelmente para o ano que vem”, afirma.
A criação do mercado regulado até o fim de 2025 é dada como certa pela maioria dos especialistas, porque o Brasil sediará a 30ª Conferência do Clima das Nações Unidas (COP30), em Belém. Como anfitrião do evento, o país deverá apresentar mais progressos possíveis no combate às mudanças climáticas.
As enchentes no Rio Grande do Sul, a seca na Amazônia e os incêndios no Pantanal também criam um “um contexto simbólico”, para a discussão do tema. Afinal, a precificação do carbono, por meio da instituição de um sistema de comércio regulado, visa fornecer incentivo financeiro à descarbonização da economia e acelerar o combate às mudanças climáticas. “O momento é oportuno”, acrescenta.
Amanhã (21/6) faz meio ano da aprovação do projeto de lei do mercado de carbono pela pela Câmara dos Deputados, na versão 2.180, que resgata uma proposta de 2015, ou seja, completará dez anos em 2025. O texto está parado no Senado, para onde voltou depois de ter sido votado em outubro do ano passado e depois encaminhado à Câmara, ainda na versão 412, de 2012, substituída nesta Casa pelo Projeto de Lei (PL) 2.180.
“Por mais que o tema climático seja ou deva ser uma prioridade, acaba não ganhando a relevância ou a atenção que deveria receber. Mas eu sou otimista. Acho que, sim, a gente está prestes a ter esse projeto de lei votado. Existe uma expectativa muito grande do mercado, da sociedade civil e acho que dos próprios políticos como um todo”, acrescenta.
Para Leal, “a gente está muito próximo de um texto bem maduro, fruto de uma discussão de muitos anos sobre o assunto”. Para ele, a regulamentação deve ser uma etapa mais cirúrgica.” Neste momento, o mais importante é “ter uma norma sólida, que estabeleça as regras gerais aplicáveis a esse sistema de comércio de emissões, com bases fundamentais para que essa regulamentação possa se dar de uma forma oportuna, mais detalhada e com ampla participação.” Na avaliação do especialista, o ideal é ocorrer uma simplificação, dentro do possível, que respeite a segurança jurídica e proteja a ambição desejada, de forma que o projeto saia do papel e que ganhe campo.
A importância do mercado voluntário
Leal destaca a relevância do mercado voluntário de carbono como instrumento para a viabilização, estímulo e implementação mais ampla possível do mercado regulado. O texto em análise no Congresso prevê que 20% dos títulos sejam oriundos de projetos calcados em soluções baseadas na natureza, os chamados REDD+, oriundos do mercado voluntário.
Para ele, a regulamentação deve criar instrumentos que estimulem o desenvolvimento de soluções baseadas na natureza, uma vantagem do Brasil, e estimular o desenvolvimento do mercado voluntário. “O cuidado que se deve ter é não detalhar por demais essa matéria neste momento e engessá-la, de uma forma que descaracterize a flexibilidade e o dinamismo do mercado voluntário, que tem essas características por natureza.”
O projeto de lei do mercado regulado reconhece a possibilidade de uma compensação de emissões de carbono que se valha de créditos gerados no mercado voluntário, mas será necessário um processo de certificação, de acordo com uma metodologia credenciada. Assim, os créditos do mercado voluntário poderiam migrar para o sistema de comércio regulado.
Como melhorar a qualidade dos créditos de carbono do mercado voluntário, frequentemente alvos de denúncias de irregularidades? Para ele, isso também deve ser objeto da regulamentação. “Eu concordo que um grau de segurança jurídica é necessário. A ponderação que se faz é que isso seja implementado e disciplinado no âmbito da regulamentação da lei e que a lei tenha os conceitos mais basilares, que reconheçam essa possibilidade de compensação.”
Leal reforça que as mudanças climáticas exigem ações urgentes, imediatas. “A ciência já deu claramente o seu recado. Todas as medidas para o combate às mudanças climáticas devem ser implementadas o quanto antes. Então, qualquer atraso é relevante”, finaliza.
A entrevista completa está no CarbonCast, o podcast do Carbon Report. Clique para ouvir