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Mudanças climáticas, El Niño e falhas de infraestrutura estão por trás das enchentes no RS

Mudanças climáticas, El Niño e falhas de infraestrutura estão por trás das enchentes no RS

Redução do investimento e falta de manutenção do sistema de proteção contra inundações também contribuiu para os impactos significativos das cheias sem precedentes

 

03 de junho de 2024

Mudanças climáticas, El Niño e falhas de infraestrutura estão por trás das grandes enchentes no Rio Grande do Sul. A conclusão é de estudo da rede internacional de cientistas World Weather Attributon (WWA), divulgado nesta segunda-feira. As inundações sem precedentes, ocorridas de abril a maio de 2024 no Rio Grande do Sul, afetaram mais de 90% do estado, uma área equivalente ao Reino Unido, deslocando 581.638 pessoas e causando 169 mortes.

Investigadores do Brasil, Reino Unido, Suécia, Países Baixos e EUA trabalharam juntos para saber se e em que medida as alterações climáticas alteraram a probabilidade e a intensidade das chuvas que causaram as inundações. A conclusão é de que as mudanças climáticas aumentaram em duas vezes as probabilidades de ocorrência de enchentes como as registradas no Rio Grande do Sul. Já a falta de investimento e de manutenção do sistema de proteção contra inundações aumentou o potencial destrutivo das chuvas.

Os cientistas chamam a atenção para o fato de as inundações terem deslocado mais de 80 mil pessoas, deixado mais de 150 mil feridos e, no dia 29 de maio, além dos 169 mortos e 44 pessoas ainda desaparecidas, segundo dados do governo do estado. Os serviços essenciais também foram interrompidos, deixando 418,2 mil famílias sem eletricidade e mais de um milhão de unidades consumidoras sem água. Dezenas de municípios também perderam serviços de telefonia e internet.

Entre as principais conclusões estão

Embora o Rio Grande do Sul seja muitas vezes visto como uma região próspera, ainda apresenta bolsões significativos de pobreza e marginalização. O baixo rendimento foi identificado como um factor significativo do impacto das cheias.
Assentamentos informais, aldeias indígenas e comunidades predominantemente quilombolas (descendentes de africanos escravizados) foram severamente afetadas.

A falta de um evento de inundação extrema significativo, até recentemente, em Porto Alegre levou à redução do investimento e à manutenção do seu sistema de proteção contra inundações, com o sistema alegadamente começando a falhar a 4,5 m de inundação, apesar da sua capacidade declarada de suportar água de 6 m. Isto, para além da natureza extrema deste evento, contribuiu para os impactos significativos das cheias e aponta para a necessidade de avaliar objetivamente o risco e de reforçar as infra-estruturas de cheias para serem resilientes a esta e a futuras cheias, ainda mais extremas.

O El Niño Oscilação Sul, um fenômeno climático natural, foi considerado importante para explicar a variabilidade nas chuvas, consistente com pesquisas anteriores. A maioria dos eventos anteriores de fortes chuvas na área ocorreu durante os anos do El Niño. O papel do El Nino por si só é comparativamente grande.

Embora existam leis de proteção ambiental no Brasil para proteger as hidrovias e limitar as mudanças no uso do solo, elas não são aplicadas ou executadas de forma consistente, levando à invasão de terras propensas a inundações e, portanto, aumentando a exposição das pessoas e da infraestrutura aos riscos de inundação.

As previsões e os avisos das cheias estavam disponíveis com quase uma semana de antecedência, mas o aviso pode não ter chegado a todas as pessoas em risco e o público pode não ter compreendido a gravidade dos impactos ou saber que ações tomar em resposta às previsões. É imperativo continuar a melhorar a comunicação de riscos para salvar vidas, dizem os cientistas.

Foto: Caroline Ferraz/Sul21