O engenheiro Christos Totikidis fala sobre os investimentos da Grécia em energias limpas. A PPC, maior companhia de eletricidade do país, adquire a Enel Romênia para ampliar portfólio renovável
Athenas, 16 de novembro de 2023
Mariza Louven
Quem chega a Atenas, na Grécia, espera ver uma linda paisagem e ilhas paradisíacas antes de mergulhar nos mistérios da mitologia grega, conhecer a Acrópole e provar um dos melhores azeites do mundo, entre outras delícias. Este cenário milenar é composto agora, também, por cataventos e painéis solares que mostram aos recém-chegados, já do avião, os progressos do país em sua nada fácil, mas necessária, transição energética.
Em entrevista ao Carbon Report, o engenheiro elétrico Christos G. Totikidis fala sobre o que a Grécia está fazendo para deixar para trás o lignito, um tipo de carvão mineral no qual a eletrificação do país foi baseada. Enquanto investe em energias renováveis e limpas, como a eólica e a solar, o país planeja fechar todas as suas centrais elétricas a lignito até 2028, embora seja um grande produtor do mineral.
O desafio econômico e ambiental é grande para o país, que lida com o aumento do custo da energia ao mesmo tempo em que sofre perdas provocadas por incêndios devastadores, elevação do nível do mar e outros efeitos das mudanças climáticas.
“A base fundamental do planejamento estratégico, principalmente da PPC S.A., que também é o maior produtor de eletricidade do país, é a eliminação gradual do carvão, visando simultaneamente um aumento de cinco vezes na capacidade instalada de Fontes de Energia Renováveis (FER) nos próximos anos. No fim de 2023, a PPC S.A. terá capacidade instalada de 1GW, com o objetivo de atingir 5 GW até 2026. Neste momento, estão sendo construídos parques fotovoltaicos de última geração na Macedônia Ocidental e no Peloponeso, que substituirão gradualmente as unidades de carvão. Já de 2019 a 2022, a empresa reduziu suas emissões de gases de efeito estufa em 36%”, informa Totikidis, que vive na cidade de Kozani, na Macedônia, região onde também nasceu Alexandre, o Grande, conquistador do mundo em seu tempo.
Embora trabalhe para a PPC S.A., ele deixou claro que as opiniões são pessoais e não em nome da companhia. Preciosista, fez um retrato detalhado da situação energética da Grécia, país que apareceu no noticiário do Brasil, no último verão europeu (inverno para nós), principalmente devido aos grandes incêndios florestais ocorridos no período.
O governo da Grécia planeja fechar ainda este ano quatro unidades termelétricas a carvão. “Em suma, abandona o plano de duplicação da produção de eletricidade a lignito que havia sido anunciado em plena crise energética, quando os preços do gás natural ficaram proibitivos por muito tempo. A justificativa para essa mudança, segundo os autores do novo Plano Nacional de Energia e Clima, apresentado mês passado à Comissão Europeia, reside na necessidade de acelerar a descarbonização após os recentes incêndios e inundações devastadores.”
Estações de renováveis devem ocupar as áreas de mineração de carvão
A orientação é priorizar a energia limpa, o que vem impulsionando o planejamento de grandes projetos de estações de produção e armazenamento de renováveis para ocupar as áreas de mineração e substituir gradativamente as unidades de carvão. Estão sendo analisados, ainda, usos alternativos e investimentos em novas tecnologias nas infraestruturas existentes.
O carvão mineral sempre foi muito importante para a economia grega. Nos últimos anos, porém, a produção de eletricidade a partir do mineral diminuiu significativamente, principalmente devido ao grande aumento do preço das licenças de emissão de dióxido de carbono (CO2). A eliminação progressiva vai durar até 2028, com a cessação de toda a produção, informa Totikidis.
Existem, porém, conflitos que ainda estão sendo solucionados. O investimento para a construção da usina termelétrica ‘Ptolemaida V’, movida a carvão, decidido na década 2000, prosseguiu, ultrapassando 1,4 bilhão de euros nos últimos anos. “Isso vem de um momento em que a participação do combustível fóssil nacional no mix de geração de energia era considerado o caminho certo para salvaguardar a segurança energética. As emissões poluentes da nova planta são 60% menores e o de material particulado em 90%.”
O aumento da produção de energias eólica e solar também tem causado desequilíbrio entre a geração de eletricidade e a demanda. “Por meses, tanto o Operador do Sistema de Transmissão (ADMIE) quanto o Operador do Sistema de Distribuição de Energia Elétrica (HEDNO) foram forçados a cortar sistematicamente a produção de renováveis para evitar a queda de energia!”
Segundo ele, a PPC Renewables segue um desenvolvimento estratégico multifacetado e pode alcançar mais cedo sua meta de 5 GW, estabelecida para cinco anos. O impulso aos seus planos de desenvolvimento será dado pela aquisição da Enel Romênia, em processo de due diligence.
A Enel na Romênia é proprietária da Enel Green Power, que possui 12 usinas fotovoltaicas com capacidade de 35,7 MW e parques eólicos de 498,4 MW, com capacidade total de 534 MW. Além da capacidade instalada de fontes renováveis e em construção, a aquisição inclui um gasoduto. A PPC também adquiriu 70% desta empresa.
A PPC Renewables também assinou um acordo com a Mytilineos para o desenvolvimento, construção e comercialização de um portfólio de energia solar de aproximadamente 210 MW, composto por dois parques fotovoltaicos localizados na Romênia, perto Bucareste, com previsão de entrada em operação comercial em 2024.
Energia solar viabiliza preservação do passado e do futuro no Museu da Acrópole
Além dos parques solares e painéis que podem ser visualizados pelo visitante, já do avião, chama atenção na paisagem de Atenas a quantidade de boilers para aquecimento solar da água instalados no topo dos edifícios e casas. A visita à cidade revela, ainda, uma experiência bem-sucedida de preservação do passado e do futuro, num de seus mais importantes pontos turísticos, o Museu da Acrópole.
A energia do sol está ajudando a preservar e manter este patrimônio cultural grego e de toda a humanidade, por meio de uma estrutura harmonizada com a arquitetura e a estética, de forma a não comprometer o significado histórico do acervo e do entorno. Considerado um dos museus arqueológicos mais importantes do mundo, o local oferece uma vista panorâmica da Acrópole, construída entre dois e quatro mil anos antes de Cristo e destruída várias vezes, por povos invasores – ocasiões em que muitas peças foram levadas e hoje compõem o acervo de museus em outros países.
O prédio envidraçado do Museu da Acrópole tem painéis solares integrados ao design do telhado para não comprometer a integridade visual das peças, muitas delas gigantescas, vindas da Acrópole. Os painéis solares especialmente projetados foram usados para combinar com o estilo arquitetônico.
A construção também utiliza um sistema de gestão de energia para maximizar a eficiência energética, garantindo que as esculturas sejam preservadas em condições ambientais ideais. Viabiliza, ainda, exposições interativas e educativas enfatizando a importância da preservação do património cultural da Grécia. É uma fusão bem-sucedida de energia limpa e uso de tecnologia moderna para garantir a integridade do passado e do futuro.
Um raio x energético da Grécia
Leia, a seguir, a entrevista completa do engenheiro elétrico Christos G. Totikidis ao Carbon Report.
Carbon Report: O que a Grécia está fazendo para conter os efeitos da mudança climática?
Totikidis: Respondo com parte do trecho do discurso do primeiro-ministro da Grécia, na conferência do clima na sede da ONU, em setembro de 2020, em Nova York, de onde emerge nossa política sobre mudanças climáticas: ‘Meu país é um caleidoscópio de belezas naturais e patrimônio cultural único. Respeito pelo mundo natural foi um pilar fundamental de muitos filósofos gregos, que compreenderam as consequências da perturbação do delicado equilíbrio entre o homem e a natureza. No entanto, os gregos antigos não tinham acesso a dados científicos, apenas faziam suposições. Nós não temos essa desculpa, mas não agimos. O futuro econômico da Grécia está ligado à sua capacidade de proteger o seu ambiente natural único. A subida do nível do mar ameaça as nossas costas e ilhas. Eventos climáticos extremos, como tempestades, inundações e ondas de calor, têm
um impacto devastador na sociedade grega e na nossa economia. Estamos totalmente comprometidos com a implementação do Acordo de Paris e da Agenda 2030 das Nações Unidas e os seus 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS). O meu governo apoia fortemente a visão estratégica de longo prazo para uma economia da União Europeia climate-free até 2050. Para nós, não se trata apenas de uma obrigação, mas uma oportunidade. Já atingimos as nossas
metas de redução de emissões de gases com efeito de estufa para 2020. Geramos 20% da nossa eletricidade a partir de fontes de energia renovável e pretendemos chegar a 35% até 2030. O nosso objetivo é fechar todas as centrais elétricas a lignito até 2028, apesar de sermos um grande produtor..’
Desde que esse discurso foi feito, o que avançou?
Totikidis: Hoje, com base no Plano Nacional de Energia e Clima (PNEC) revisado e apresentado recentemente pelo governo à Comissão (novembro de 2023), um ‘fechamnto” das quatro unidades de lignito de Agios Demetriou (I-IV) está previsto para o final de 2023, ou seja, dentro de algumas semanas. Duas delas fornecem aquecimento ao Distrito de Kozani, ao Norte da Grécia, na região da Macedônia. A operação dessas quatro unidades havia sido assegurada até ao final de 2025, pelas Decisões Ministeriais de 2021 e 2022. Ao mesmo tempo, o novo PNEC mantém as datas finais conhecidas da produção de energia a lignito, por um lado, para as unidades Agios Dimitrios V, Meliti (final de 2025) e por outro lado Ptolemaida V (final de 2028). Para este último, no entanto, de acordo com o PNEC, o calendário não é definitivo, porque ‘a aceleração da eliminação progressiva do lignito é bem avaliada antes de 2028 (…)’. Em suma, o Governo abandona o plano de duplicação da produção de eletricidade a lignito, que havia sido anunciado em plena crise energética, quando os preços do gás natural ficaram proibitivos por muito tempo. A justificativa para essa mudança, segundo os autores do novo PNEC, reside na necessidade de acelerar a descarbonização após os recentes incêndios e inundações devastadores.
Qual é a principal estratégia para reduzir as emissões de carbono?
Totikidis: Hoje, a PPC S.A. possui em seu mix de produção convencional a energia termelétrica produzida a partir de usinas de gás natural, carvão e petróleo, localizadas em ilhas não interligadas do país. No entanto, com a orientação para a priorizar a energia limpa, grandes projetos de estações de produção e armazenamento de energia renovável já foram planejados para ocupar as áreas de mineração, substituindo gradativamente as unidades de carvão. Além disso, estão sendo analisados usos alternativos e investimentos em novas tecnologias nas infraestruturas existentes.
Qual é o portfólio da PPC?
Totikidis: A PPC tem em seu portfólio usinas de gás natural em Lavrio (945MW), Komotini (485MW), Aliveri (427MW) e Megalópole (832MW). Ao mesmo tempo, possui as unidades de carvão de Ag. Demetriou (1.595MW), de Meliti (330MW) e de Megalopoli (600MW), enquanto a nova planta de carvão Ptolemaida V (660 MW) entrou em operação. As ilhas não interligadas, incluindo Creta e Rodes, são servidas por centrais petrolíferas autônomas (1.819MW) e RES.
Como será feita a eliminação progressiva do carvão?
Totikidis: As minas de carvão nas zonas de Aliveri, Kozani e Megalopoli asseguraram, desde 1955 e durante um período de cerca de 65 anos, o fornecimento de carvão, um importante combustível para a economia grega, no qual se baseou a eletrificação do país desde a criação da empresa PPC S.A. Nos últimos anos, a produção de eletricidade a partir do carvão diminuiu significativamente, principalmente devido ao aumento significativo do preço das licenças de emissão de dióxido de carbono (CO2). A eliminação progressiva do carvão do país durará até 2028, com a cessação da produção de carvão.
Os seguintes meios de produção já foram permanentemente desativados e retirados: Unidade I, II, III e IV Ptolemaida TPP, Unidade I e II UTE LIPTOL, Unidade I, II, III e IV UTE Aliveri, Unidade I, II e III Keratea – Lavrio UTE, Unidades 8 e 9 UTE Agios Georgios, Unidades I, II, III e IV UTE Kardia, Unidades I e II de Amyntaio – Filota TPP, Amyntaio Field Mine, Kardia Field Mine, enquanto para a unidade ‘Megalopoli III’ (300MW) foi submetido um pedido de retirada relevante. Até o final de 2023, a operação de produção das Minas Megalopoli deverá ser descontinuada.
Como tem sido a implantação de energia eólica e solar?
Totikidis: De acordo com o plano decenal de desenvolvimento 2024-2033 da rede de transmissão de eletricidade, no final de 2022, 4.556 KW de energía eólica e 5.150 KW de energia fotovoltaica foram operadas a partir de um sistema interligado (continente e ilhas interligadas), um total de 10.256 MW. Dado que a procura de eletricidade raramente excede os 7.000 MW, o desequilíbrio entre a geração de eletricidade e a demanda representa um risco de apagões. Por meses, tanto o Operador do Sistema de Transmissão (ADMIE) quanto o Operador do Sistema de Distribuição de Energia Elétrica (HEDNO) foram forçados a cortar sistematicamente a produção (FER) para evitar a queda de energia!
Independentemente do exposto, tendo em conta que se trata de uma decisão tomada (na década 2000), o investimento para a construção de ‘Ptolemaida V’ prosseguiu, ultrapassando 1,4 bilhão de euros. É a planta de carvão mais moderna da PPC, com o menor impacto ambiental em comparação com o resto do portfólio de carvão. A planta está em operação comercial, aumentando o potencial termelétrico nacional, bem como o portfólio de carvão da PPC. Isso vem de um momento em que a participação do combustível fóssil nacional no mix de geração de energia era considerado o caminho certo para salvaguardar a segurança energética. As emissões poluentes da nova planta são 60% menores e o de material particulado em 90%.
Vi muitas estruturas para gerar energia eólica do avião e também vejo muitos
painéis solares nos telhados. O país tem tido sucesso na substituição de energia por fontes renováveis?
Totikidis: A base fundamental do planejamento estratégico, principalmente da PPC, que também é o maior produtor de eletricidade do país, é a eliminação gradual do carvão, visando simultaneamente um aumento de cinco vezes na capacidade instalada em Fontes de Energia Renováveis (FER) nos próximos
anos. No fim de 2023, a PPC S.A. terá capacidade instalada de 1 GW, visando atingir 5 GW até 2026. Neste momento, estão sendo construídos parques fotovoltaicos de última geração na Macedônia Ocidental e no Peloponeso, que substituirão gradualmente as unidades de carvão. Já de 2019 a 2022, a empresa reduziu suas emissões de gases de efeito estufa em 36%.
As fontes de energia renováveis incluem hidrelétrica, eólica, solar, geotérmica, biomassa e sistemas híbridos. A capacidade total instalada das centrais hidrelétricas soma 3.238 MW. Dois pequenos aterros sanitários, com capacidade total de 200 MW, estão atualmente em construção. A força do vento já é usada para garantir uma capacidade instalada de aproximadamente 115 MW, em 31 parques eólicos. A PPC Renewables também está em processo de conclusão de novos parques fotovoltaicos com capacidade de 200 MW na área de Ptolemaida e 50 MW na área de Megalopoli.
Quais são os principais investimentos da PPC em alternativas de energia?
Totikidis: A PPC promove de forma dinâmica o seu programa de investimento na produção de energia, promovendo investimentos em todas as tecnologias de produção. Tendo concluído o significativo investimento em Ptolemaida V, que se encontra em operação comercial, fechou o acordo para aquisição de 51% na nova
usina de gás natural em Alexandroupolis, em conjunto com a DEPA Commercial e a DAMCO (Grupo Copelouzos).
A PPC Renewables segue um desenvolvimento estratégico multifacetado em proporção de energia fóssil (fossil energy ratio), através de parcerias e aquisições. A meta de 5 GW que estabeleceu para cinco anos pode ser alcançada mais cedo. O impulso aos seus planos de desenvolvimento será dado pelo plano de aquisição da Enel Romênia, que está em processo de due diligence. PPC também adquiriu 70% da subsidiária da Enel na Roménia, a Enel Green Power, com mais de 3,1 milhões de clientes em sua rede de distribuição e unidades fontes renováveis de energia (renewable energy sources – RES).
O que este investimento agrega ao portfólio da empresa?
Totikidis: A Enel Green Power possui 12 usinas fotovoltaicas com capacidade de 35,7 MW e eólicas parques de 498,4 MW, com capacidade total de 534 MW. Esta aquisição, além da capacidade instalada de fontes renováveis e em construção, irá adicionar à capacidade da PPC o gasoduto de 1+4 GW da Enel, dos quais 1 GW será construído nos próximos três anos.
A PPC Renewables também assinou um acordo com Mytilineos para o desenvolvimento, construção e comercialização de um portfólio de energia solar de aproximadamente 210 MW, composto por dois parques fotovoltaicos, localizados na região sul da Romênia, perto Bucareste, com previsão de entrada em operação comercial durante 2024. Ambos os projetos foram desenvolvidos pela MYTILINEOS, que também realizará a construção.
Além disso, a PPC Renewables foi declarada Investidor Preferencial no contexto de uma licitação realizada pela Piraeus Equity Partners para a venda (SPA) de ações de empresas proprietárias parques eólicos com capacidade total de 44 MW e parques fotovoltaicos com capacidade de 2 MW.