Estudo da Agência Francesa de Desenvolvimento sugere que políticas de desenvolvimento sustentável visem reduzir a dependência de bens de capital importados e aumentar a cesta de exportações
16 de julho de 2024
A crescente demanda por bens de capital (máquinas e equipamentos) produzidos no exterior para fazer frente à transição para uma economia de baixo carbono levará os países em desenvolvimento a enfrentar restrições de capital, à medida em que embarcam na trajetória de descarbonização. A conclusão é de estudo do estudo “Desafios na transição para uma economia de baixo carbono para países em desenvolvimento”, da Agência Francesa de Desenvolvimento.
Segundo a análise, de cada dólar investido exclusivamente para manter a capacidade produtiva atual, em média mais de 45% vazam direta e indiretamente para produtores estrangeiros por meio de importações. Para setores intensivos em importações, como Telecomunicações, Transportes, Construção, pode chegar a 80%. “Alguns benefícios socioeconômicos do investimento verde, como a geração de empregos, são absorvidos pelo resto do mundo, em vez de fomentar a criação de empregos domésticos”, dizem os pesquisadores.
Para explicar o papel dos bens de capital (máquinas e equipamentos) no processo de transição para o baixo carbono, os pesquisadores estudaram a estrutura de capital e de produção de seis países em desenvolvimento e emergentes na América Latina e no Caribe (Colômbia, Costa Rica, República Dominicana, Honduras, México e Peru), no período de 1990 a 2020. O Brasil é citado rapidamente.
De acordo com o relatório, a transição para o baixo carbono vai confrontar os países em desenvolvimento com o desafio não só de alcançar uma descarbonização bem-sucedida da sua economia, mas também a necessidade de dominar esse processo com crescente igualdade e redução das assimetrias do sistema internacional.
Descarbonização com redução de importações
Os resultados sugerem que as políticas que promovem o desenvolvimento sustentável nos países em desenvolvimento deveriam ter como objetivo reduzir a dependência de insumos e bens de capital produzidos no estrangeiro ou aumentar o grau de sofisticação da cesta de exportações.
No entanto, com 80% da produção de bens de capital concentrada em apenas 10 países do mundo, mesmo em países desenvolvidos, a substituição é limitada por uma forte dependência de bens de capital produzidos no estrangeiro, diz o texto, tornando a dissociação do investimento dos bens de capital importados dificilmente alcançável. O estudo assinala que o Brasil conseguiu aumentar com sucesso sua capacidade produtiva e de exportação de equipamentos manufaturados e agrícolas, apesar de sua integração na rede global de comércio de bens de capital ser ainda baixo.
Dependência externa pode atrasar descarbonização
Com uma forte dependência de importações de investimentos e bens de capital, os países em desenvolvimento enfrentam uma maior restrição no balanço de pagamentos, com a acumulação de capital interno sendo suprimida pela necessidade constante de atrair divisas necessárias para pagar por produtos adquiridos no exterior. Isto leva os países em desenvolvimento a intensificar sua produção e exportação de commodities primárias, produtos de baixo valor agregado e, muitas vezes, de emissões intensivas de carbono, para garantir as necessárias entradas de capital.
Isso não só atrasa o processo de descarbonização, mas dificulta a geração de emprego e a distribuição de renda em toda a sociedade. Além disso, como a maioria das principais indústrias de exportação tende a ser muito intensiva em emissões, esse processo pode causar danos ambientais permanentes.
Segundo o estudo, a natureza e a composição do investimento verde são complexas, abrangendo tanto bens de capital manufaturados sofisticados e de alto conteúdo tecnológico, como máquinas e equipamentos e software, além de infraestrutura verde. Alguns exemplos:
Agro
O setor agrícola, por exemplo, com um dos maiores impactos climáticos e de biodiversidade, enfrenta o duplo desafio de fornecer alimentos acessíveis a uma população em crescimento e, ao mesmo tempo, reduzir o seu impacto ambiental através da redução das emissões de gases de efeito estufa e da limitação da utilização do solo. Neste contexto, bens de capital sofisticados para reduzir ou substituir fertilizantes químicos e investimentos em infraestrutura para promover práticas agroflorestais e sistemas silvipastoris são indispensáveis para uma transição sustentável.
Energia
No setor da energia, a transição para as fontes de energias renováveis como a solar, a eólica e o hidrogénio verde necessitam de bens de capital de alta tecnologia, além de investimentos substanciais em infraestruturas para apoiar a geração, transmissão e distribuição de eletricidade, exigindo a construção de usinas de energia renovável, atualizações de rede e sistemas de armazenamento.
Transportes
Já em setores como o de transportes, o aumento da produção de veículos elétricos exige bens de capital avançados.
Telecomunicação
No contexto da transição digital, o setor das telecomunicações requer soluções sofisticadas de bens de capital, juntamente com uma necessidade substancial de investimentos em infraestruturas para garantir uma cobertura abrangente em áreas urbanas e rurais.
Água e saneamento
Os investimentos em maquinário de alta tecnologia para melhorar a segurança hídrica e o acesso equitativo à água potável, bem como em infraestrutura para gerenciar eventos climáticos extremos (tais como cheias e as secas) são indispensáveis para garantir uma descarbonização bem sucedida da economia.