Calculadora de Financiamento Climático visa subsidiar discussões em fóruns internacionais como a Semana do Clima de Nova York, COPs, G20 e Assembleia Geral da ONU
17 de setembro de 2024
Mariza Louven
Quais países devem pagar pelo financiamento climático internacional? Os Estados Unidos aparecem em primeiro lugar, seguidos da China, de acordo com a Calculadora de Financiamento Climático lançada nesta terça-feira (17/9) pelo WRI (World Resources Institute). O Brasil figura na décima posição desse ranking que considera fatores como emissões históricas de gases de efeito estufa, população, PIB e renda per capita para atribuir responsabilidade aos países.
Com as temperaturas do planeta batendo todos os recordes, o sempre presente debate em torno de quem vai pagar a conta das mudanças climáticas esquenta às vésperas dos grandes eventos internacionais sobre o tema. O objetivo do estudo do WRI é subsidiar discussões em fóruns como a Semana do Clima de Nova York, semana que vem, e a Conferência da ONU (COP16 da Biodiversidade), na Colômbia. Depois tem a reunião do G20, no Brasil, a Assembleia Geral da ONU, em Nova York, e a Conferência do Clima de Baku (COP29), no Azerbaijão.
“Estamos todos nos preparando para a semana climática, semana que vem, mas isso é só o início de uma jornada de 18 meses de diversas reuniões”, disse o CEO do WRI, Ani Dasgupta (foto), durante webinar ocorrido hoje. Segundo ele, o financiamento de alta qualidade é uma das questões mais urgentes. A transição de uma economia dos combustíveis fósseis para a de baixo carbono requer grande investimento, acrescentou.
“O entendimento coletivo é de que será necessário um apoio de US$ 1 trilhão para os países emergentes todos os anos”, disse Dasgupta. Segundo ele, esse dinheiro tem que vir de diversas fontes e cada país precisa encontrar o seu próprio caminho para a descarbonização, mas que as ações e políticas adotadas internamente podem torná-los mais atraentes para o capital estrangeiro.
Na COP29, este ano, em Baku, no Azerbaijão, os negociadores vão fixar um novo objetivo de financiamento climático, disse Melanie Robinson, diretora do Programa Climático Global do WRI. Na cúpula da ONU de Copenhague, em 2009, os países desenvolvidos concordaram em desembolsar US$ 1 bilhão por ano para apoiar os emergentes até 2020, prazo depois estendido. Demorou, mas a meta foi alcançada em 2022. No entanto, segundo ela, o contexto mudou.
O agravamento da crise climática provocou a necessidade de muito mais financiamento. “Os países desenvolvidos e a China podem provavelmente financiar sua própria transição, mas a gente sabe que os países emergentes precisam de financiamento externo. Números levantados no G20 já estimam em US$ 3,4 trilhões o montante que os países emergentes vão precisar por ano, quatro vezes mais do que o estimado inicialmente”, afirmou Robinson. Segundo ela, US$ 500 devem vir de financiamento privado. A reunião de Baku vai discutir como fechar essa lacuna.
Como calcular quem vai pagar quanto?
O estudo do WRI oferece insights para subsidiar discussões como as relacionadas à nova meta coletiva sobre financiamento climático do Fundo de Perdas e Danos e o Green Climate Fund. Embora os dados não forneçam uma única resposta, fica claro que países de baixa renda e baixa emissão não têm papel a desempenhar como contribuintes em nenhum cenário, diz o WRI.
Segundo a instituição, combinar métricas de emissões históricas de carbono, PIB e renda per capita fornece um resultado mais razoável para possíveis mudanças na lista atual de países instados a arcar com o financiamento climático. Olhar apenas para uma dessas métricas, por si só, pode fornecer resultados distorcidos.
O que está valendo até agora
Por meio da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima (UNFCCC) e do Acordo de Paris, os países membros da ONU assumiram compromissos financeiros como o fundo para ajudar nações em desenvolvimento a se recuperar de perdas e danos provocados por eventos climáticos extremos. Em 2009, as nações desenvolvidas concordaram que, até 2020, mobilizariam US$ 100 bilhões por ano para esse fim, meta alcançada em 2022.
A expectativa é de que um novo acordo seja estabelecido este ano, em Baku, para substituir a meta de US$ 100 bilhões, considerada superada. No entanto, os países desenvolvidos estão pressionando para que outras nações com níveis relativamente altos de riqueza e emissões de CO2, como a China, também contribuam.
O que a calculadora do WRI mostra
A calculadora identifica três principais pontos a serem considerados. O primeiro é que, em qualquer cenário razoável, os Estados Unidos devem liderar os desembolsos. Desde a criação da meta de US$ 100 bilhões para o fundo de perdas e danos, os EUA nunca chegaram perto de cumprir a sua parcela justa de financiamento climático, diz o WRI. As contribuições de outras nações do Anexo II (EUA, Alemanha e outros países desenvolvidos) também precisam aumentar, mas não no mesmo grau que as dos EUA, diz o estudo.
Análise das responsabilidades dos países
Uma das mudanças para as quais o WRI chama a atenção é o fato de que, nos mais de 30 anos desde que os países foram identificados no Anexo II, a renda per capita mundial triplicou, refletindo ganhos nominais e reais nos padrões de vida. Alguns países não listados no documento, como a China, têm agora riqueza e emissões de carbono superiores às de algumas nações do Anexo II.
De acordo com o WRI, o debate sobre se essa nova realidade deve alterar a lista de nações contribuintes, mas não sem polêmicas, durante a cúpula da ONU no Azerbaijão.
Calculadora de metas de financiamento climático
Segundo a metodologia adotada, as emissões podem ser medidas a partir de dois pontos no tempo: de 1850, após a Revolução Industrial, quando romperam com os padrões históricos; ou uma data mais próxima de quando a ameaça da mudança climática se tornou mais bem compreendida, talvez por volta de 1990, ano em que a primeira avaliação do Painel Internacional sobre Mudanças Climáticas foi publicada. Historicamente, o Brasil aparece no quinto lugar, mas nos anos mais recentes melhorou a sua posição, que passou a ser a sexta no ranking.
A China tem as maiores emissões cumulativas desde 1990, tendo ultrapassado os EUA no total anual no início dos anos 2000. No entanto, as emissões chinesas per capita ainda são quatro vezes menores do que as dos EUA. Enquanto isso, por outro lado, alguns países menores agora têm renda per capita (por habitante) e/ou emissões mais altas do que os EUA.
Por isso, além de quando iniciar a medição, o WRI também considera que deve ser considerado o tamanho da população e suas emissões per capita. Caso contrário, as grandes nações poderiam ser favorecidas em relação às menores em termos de obrigações quanto ao financiamento climático, mesmo que cada pessoa no grande país poluísse menos.
Basear a responsabilidade apenas em medidas de emissões per capita, no entanto, apresenta seus próprios problemas. Significaria que dois países de tamanhos muito diferentes, mas emissões per capita semelhantes (como os Estados Unidos e a Islândia), seriam responsáveis pela mesma quantidade de fundos – um resultado irrealista.
Comparando o status econômico
Outro ponto considerado é a renda nacional. Aí, também, a questão populacional pesa. A Índia, por exemplo, é a sexta maior do mundo, à frente de muitos países desenvolvidos, mas tem uma população de 1,45 bilhão de pessoas, o que a coloca em 142º lugar no ranking de renda per capita. Isso poderia ser usado como argumento de que não deveria ser obrigada a contribuir com financiamento. O foco na renda per capita aumentaria a responsabilidade de outros países como Catar e Cingapura.
Transparência
O estudo aponta ainda a transparência como parte da solução. Alguns países não incluídos no Anexo II, como a China, já investem em uma quantidade relativamente grande de financiamento climático em países em desenvolvimento, mas a maior parte não é relatada à UNFCCC. De 2013 a 2022, a China forneceu US$ 45 bilhões em financiamento climático para países em desenvolvimento, o equivalente a 6,1% do total climático de todos os países desenvolvidos combinados, durante o mesmo período.
Sob a nova meta de financiamento climático, esses fundos podem ser relatados e contados de alguma forma para aumentar a transparência geral e o reconhecimento para aqueles que desempenham um papel.