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Desertificação na Caatinga reduz funcionalidade do solo e sua capacidade de sequestrar CO2

Desertificação na Caatinga reduz funcionalidade do solo e sua capacidade de sequestrar CO2

Estudo da Universidade Federal do Ceará e da USP diz que a desertificação aumenta a compactação e reduz a porosidade do solo, impedindo a infiltração de água e acelerando processo de erosão

04 de junho de 2024

Pesquisadores da Universidade Federal do Ceará (UFC) e do Centro de Pesquisa e Inovação em Gases de Efeito Estufa (RCGI) da USP, analisaram, pela primeira vez, o impacto da desertificação da Caatinga. A principal conclusão é de que a degradação do solo reduz em mais de 50% sua funcionalidade, ou seja, sua capacidade de sustentar o crescimento das plantas e promover bem-estar humano e animal, além de também reduzir o sequestro de carbono pelo solo.

A Caatinga é um dos biomas brasileiros que mais sofrem pela ação humana e, consequentemente, pelas mudanças climáticas. Um estudo divulgado pela Scientific Reports em 2023 apontou que, dos seus aproximados 860 mil quilômetros quadrados, apenas 31 mil mantinham sua vegetação original.

“Por esse motivo, o semiárido brasileiro, que corresponde a 11% do território nacional, é uma das regiões mais vulneráveis às mudanças climáticas no mundo, e está, em alguns de seus núcleos, passando por um processo de desertificação. A degradação está se acentuando tanto que já foram identificadas algumas regiões de clima árido, detalha Maurício Roberto Cherubin, professor da ESALQ-USP e pesquisador do RCGI, onde é vice-diretor do programa Nature Based Solutions (NBS).

Publicado na revista Applied Soil Ecology, o estudo analisou 54 amostras de terra obtidas em temporadas de seca e de chuva, em três diferentes territórios do Núcleo de Desertificação de Irauçuba, no norte do Ceará, sendo que cada um deles conta com áreas de vegetação nativa, degradada e restaurada.

A redução de mais de 50% na funcionalidade do solo foi obtida por meio de diversas análises físicas, biológicas e químicas em áreas degradadas pela ação humana. Do ponto de vista físico, observou-se um solo bastante comprometido, principalmente pela compactação causada pelo pisoteio dos animais.

“Este fenômeno aumenta a compactação e reduz a porosidade, impedindo a infiltração de água no solo e, consequentemente, acaba acelerando o processo de erosão do solo”, explica Antonio Yan Viana Lima, doutorando em Solos e Nutrição de Plantas na Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz (ESALQ-USP), pesquisador do RCGI e primeiro autor do estudo.

“Do ponto de vista biológico, os indicadores de composição microbiana, teores de carbono e atividade enzimática mostraram-se favoráveis para o crescimento da vegetação e para o sequestro de carbono”, detalha Lima. “Por outro lado, vimos pouca variação dos indicadores químicos entre as áreas estudadas, inclusive entre áreas restauradas e degradadas. Isso indica que esse quesito foi pouco sensível para as metodologias abordadas no estudo, o que demonstra que os componentes biológicos são importantes indicadores de saúde do solo, visto que prontamente respondem a perturbações humanas no solo”, complementa.

“Já nas áreas restauradas, constatamos que, ao impedir a ação do homem, é possível atingir índices físico, químicos e biológicos próximos de sua composição original”, afirma Arthur Prudêncio de Araujo Pereira, professor da UFC e coordenador do estudo.

As áreas restauradas, segundo ele, são campos que, por meio da iniciativa do professor José Gerardo Beserra de Oliveira, do Departamento de Biologia da UFC, há mais de duas décadas, foram totalmente cercados no intuito de impedir a ação do homem e a circulação de animais. Nesses campos, não foi plantada nenhuma espécie, pois a proposta era verificar como e se a vegetação iria se regenerar naturalmente sem essas interferências.

O solo nativo da Caatinga é caracterizado por uma pouca profundidade e uma textura que pode variar de argilosa a arenosa. Já sua vegetação nativa é caracterizada por ser adaptada a longos períodos de estiagem, por meio de mecanismos que as plantas têm para reduzir a perda de água durante o período seco. “Esses fatores levam a uma rica biodiversidade, uma vez que há centenas de plantas e animais já adaptados a esse clima e a esse solo”, destaca Lima.