Negócio que gera renda para mais de 2.500 pessoas está criando seu CNPJ único para chegar ao consumidor final de seus óleos e peças em madeira da floresta
Mariza Louven
Inatú Amazônia é uma marca comunitária de produtos de baixo carbono e alto impacto social que deixou a floresta para chegar aos grandes centros de consumo. Nesse caminho, seus óleos vegetais e peças em madeira geraram renda para mais de 2.500 pessoas e apoiaram a proteção de uma área de 2,5 milhões de hectares.
Agora, depois de faturar mais de R$ 7 milhões nos últimos três anos, a Inatú está tentando criar o seu CNPJ único para facilitar o acesso de seus produtos da floresta ao mercado, informa a mauesense (nascida em Maués) Louise Lauschner, especialista de Acesso ao Mercado do Instituto de Conservação e Desenvolvimento Sustentável da Amazônia (IDESAM).
Com um público-alvo formado atualmente por outras empresas de cosméticos, cosmetólogos e aromaterapeutas que valorizam a floresta em pé, o objetivo agora é chegar ao cliente final. “Queremos viabilizar o acesso das associações aos clientes finais. Dessa maneira, o consumidor paga o preço que costuma pagar, mas as associações têm uma margem de lucro maior, possibilitando a remuneração mais justa para cadeia inteira”.
Criar um CNPJ único é fundamental para avançar no objetivo da Inatú, uma startup composta por cinco associações e um empreendimento familiar que nasceu para levar acesso ao mercado para comunidades da floresta.
Participam da Inatú as seguintes instituições: Associação Agroextrativista da Reserva de Desenvolvimento Sustentável do Uatumã (AACRDSU), Associação dos Produtores Agroextrativistas da Assembleia de Deus do Rio Ituxi (APADRIT), Associação dos Produtores Familiares Ouro Verde (APFOV), Associação Agroextrativista Aripuanã-Guariba (ASAGA), Associação de Produtores Agroextrativistas da Colônia do Sardinha (ASPACS), a empresa familiar ILC Cavallcanti, e o IDESAM.
Com o CNPJ, será possível criar um centro de distribuição em Manaus e atender a pedidos de todo o Brasil. “Se alguém no Rio de Janeiro, por exemplo, quer comprar um litro de andiroba, um de copaíba e outro de buriti, o envio tem que ser individualizado, o que encarece a compra”, explica Lauschner.
Isso acontece porque cada um desses itens é produzido em uma cidade do Amazonas: a usina produtora de buriti está situada em Apuí; a de copaíba, no município de Uatumã; e a de andiroba, em Lábrea. “Precisamos poder juntar esses três óleos em Manaus e enviar para o consumidor, mas ainda não conseguimos fazer isso em um pacote único. São necessárias três notas fiscais diferentes e, consequentemente, três envios diferentes, o que encarece muito o produto”, conta Lauschner.
“A criação de um CNPJ único também é para acessarmos plataformas como o Mercado Livre. Hoje, não conseguimos por não ter um centro de distribuição único, envios únicos e um esforço de venda também único, não só de promoção de marca, mas também de facilidade de terceirização de soluções e de envio”, conclui.
Desafios amazônicos
O sucesso da Inatú é proporcional ao tamanho dos desafios, que vão além de superar a burocracia para desenvolver um mercado relevante e sustentável para os produtos da floresta.
“Quando pensamos no mercado, estamos na última fase da cadeia de valor. Antes disso existem etapas que, dependendo do local, podem ter levado décadas para acontecer”, diz a mauesense durante a conversa com o Carbon Report.
O primeiro e principal passo, acrescenta, é a organização civil: como as pessoas se organizaram para que fosse possível pensar em uma cadeia produtiva integrada na região. “Sem essa organização é inviável chegar a um produto final”, acrescenta.
De acordo com Lauschner, existe um formato comercial de “atravessadores” e uma rede antiga de exploração dos óleos amazônicos. “Quebrar esses arranjos é o trabalho mais desafiador e importante”, opina.
Segundo ela, é preciso pensar na cadeia produtiva com os coletores e extrativistas se beneficiando da comercialização: “Se eles não têm uma mudança de valores, a comercialização não está fazendo diferença para quem mais precisa de mudança de formato de vendas”.
Desenvolvimento com conservação
Lauschner destaca a importância dos habitantes da Floresta Amazônica para a conservação do bioma: “Não podemos falar de manutenção da floresta se não promovermos dignidade e manutenção da moradia dos guardiões da Amazônia”.
Sem oportunidades, as pessoas que fazem parte de comunidades e unidades de conservação acabam tendo que buscar alternativa nas cidades, abrindo espaço para grileiros tomarem aquelas terras como “suas”. Muitas vezes, passam a viver em periferias, com piora em sua qualidade de vida.
“Ao promovermos os produtos da floresta, promovemos o aumento de renda e a estabilidade financeira das comunidades isoladas da Amazônia”, reforça.
União e força
A marca Inatú nasceu de uma parceria do Idesam, uma Oscip em atuação na Amazônia há 19 anos, com as associações apoiadas pelo Projeto Cidades Florestais. O projeto foi iniciado em 2018, financiado pelo Fundo Amazônia, gerido pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). O projeto Amazônia em Casa, Floresta em Pé, contribuiu no desenvolvimento da marca com a facilitação e financiamento de acesso ao mercado, principalmente em grandes feiras – “nosso maior mercado”, diz ela.
Com esses apoios, os povos da floresta encontraram solução para promover a conservação ambiental e melhorar sua qualidade de vida por meio da comercialização de óleos e peças em madeira. O incentivo possibilitou a produção de óleos vegetais industrializados e em maiores lotes de produção, valorizando ainda mais o trabalho das famílias que vivem do extrativismo.
Em 2019 foram iniciados os processos produtivos com boas práticas e rastreabilidade para seus produtos. A coleção Uatumã, primeira linha de produtos em madeira, surgiu em 2021 e, no ano seguinte, a Inatú conseguiu comercializar R$ 2 milhões em óleos.