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Marco regulatório da atividade de captura de CO2 cria base para mercado bilionário no Brasil

Marco regulatório da atividade de captura de CO2 cria base para mercado bilionário no Brasil

Relatório do PL 1.425/2022, que regula a captura, armazenamento ou reutilização do carbono foi aprovado pela Comissão de Meio Ambiente do Senado e deve seguir para Câmara

Mariza Louven

A Comissão de Meio Ambiente do Senado aprovou por unanimidade, nesta quarta-feira (30/8), o Projeto de Lei 1.425/2022, que estabelece as regras para captura e armazenamento de dióxido de carbono (CO2) em reservatórios geológicos ou sua utilização posterior. Se não for apresentado recurso, o texto poderá seguir para a Câmara dos Deputados e, se aprovado, estabelecer o marco regulatório fundamental para essas atividades deslancharem no Brasil. Projetos de captura, armazenamento e utilização de CO2 estão em curso em várias partes do mundo, movimentando bilhões de dólares.

De acordo com o relator da matéria, senador Veneziano Vital do Rêgo (MDB/PB), o projeto cria “um marco legal efetivo para a implementação de tecnologia voltada para redução das emissões de gases causadores de efeito estufa”. A iniciativa, segundo ele, contribui para a descarbonização de setores cujo processo de produção de bens ou os custos envolvidos não permitem a descarbonização por outros meios. Entre eles estão os setores cimenteiro, petroquímico, siderúrgico e de fertilizantes.

O processo CCS visa a descarbonização da economia por meio da captura, transporte e armazenamento do CO2 emitido durante a realização de atividades como a produção de energia ou a produção industrial. Entre os usos para o CO2 retirado da atmosfera está o armazenamento permanente em reservatórios geológicos subterrâneos – salinos ou de óleo e gás, deixados quando a produção é exaurida. Ou seu reaproveitamento, por exemplo, para a produção de combustíveis de baixo carbono.

Mercado de CO2 já está movimentando bilhões de dólares

Conhecida como CCS (Carbon Capture Storage), a aplicação da tecnologia de captura e armazenamento de carbono tem um mercado gigantesco em desenvolvimento no mundo e vem atraindo pesados investimentos públicos e privados. Nos Estados Unidos, por exemplo, o governo anunciou recentemente a doação de US$ 1,2 bilhão para o desenvolvimento de um Centro de captura direta de carbono do ar (Direct Air Capture – DAC), no sul do Texas. Esta seria a primeira parte da implantação de um programa que vai abranger mais de vinte projetos selecionados e um total de US$ 3,5 bilhões para criar hubs DAC regionais nos próximos cinco anos.

“Os EUA criaram uma série de leis que estão acelerando o desenvolvimento e redução de custos de muitas tecnologias vitais para a transição energética, incluindo DAC, afirma o engenheiro químico brasileiro Marcus Temke, vice-presidente de Engenharia e Projetos da empresa canadense Carbon Engineering.

A tecnologia da Carbon Engineering está sendo usada pela Occidental Petroleum (Oxy) para a construção de uma planta de captura de CO2 do ar em Odessa, Texas, prevista para entrar em operação em 2025. Segundo ele, serão retiradas 500 mil toneladas por ano de carbono do ar naquela instalação. A tecnologia DAC possibilita a captura do CO2 diretamente do ar para que seja transportado para poços de armazenamento subterrâneos exauridos ou usado em diversos tipos de indústria.

De acordo Temke, o CO2 capturado pode, por exemplo, ser combinado com o hidrogênio verde para a produção de combustíveis sintéticos, como diesel e querosene de aviação de baixa intensidade de carbono. A tecnologia DAC permite capturar carbono em grande escala, de qualquer chaminé, assegura.

A Carbon Engineering também está na fase de engenharia de uma segunda planta, em Corpus Christi, no sul do Texas, com capacidade de capturar 1 milhão de toneladas de CO2 por ano. “O Departamento de Energia dos EUA (DOE) anunciou que selecionou essa 2a planta como um Hub de Sequestro de CO2 que receberá substanciais grants (recursos a fundo perdido) para construção, que começará ano que vem e vai operar em 2027”, disse ele ao Carbon Report. O DOE também anunciou que vai comprar créditos de remoção de carbono para ajudar a criar demanda, acrescenta.

Diversos projetos estão em desenvolvimento em outros países, indicando o potencial desse mercado. O Port of Rotterdam CO2 Transport Hub and Offshore Storage (Porthos, ou Centro de Transporte de CO₂ do Porto de Roterdã e Armazenamento Offshore), maior instalação de captura e armazenamento de carbono da Europa, também recebeu mês passado o sinal verde do Conselho de Estado da Holanda, a mais alta corte do país. O hub deverá capturar e armazenar 2,5 milhões de toneladas de CO2 por ano, durante 15 anos, contribuindo para reduzir as emissões anuais de CO2 da Holanda em cerca de 2% a partir de 2026.

Segurança jurídica necessária

O objetivo do marco regulatório é contribuir no cumprimento das metas brasileiras de redução das emissões de gases de efeito estufa; incentivar a adoção de tecnologias de captura, transporte, armazenamento permanente de CO2 em reservatórios geológicos; e fomentar a exploração de fontes energéticas com emissões de carbono reduzidas, ou negativas na avaliação do ciclo de vida.

As atividades de armazenamento serão exercidas através de outorga do Poder Executivo para a exploração de reservatórios geológicos em bloco de armazenamento, segundo o PL.

O projeto foi apresentado em 2022 pelo então senador Jean Paul Prates, hoje presidente da Petrobras. Quando Jean Paul apresentou o PL, destacou que, entre as diversas estratégias disponíveis para viabilizar a descarbonização da economia, está o uso de mecanismos de sequestro geológico de carbono, ou CCS.

“No plano global, a atividade de CCS tem sido apontada como elemento estratégico em diversas projeções de cenários de transição que visam atingir metas de emissões líquidas de zero CO2 até 2050, conforme relatórios da Agência Internacional de Energia (AIE) e do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC)”, pontuou o então parlamentar na justificativa. 

Ainda segundo o Jean Paul, um dos diferenciais está relacionado ao fato do sistema de captura poder ser integrado a diferentes tipos de infraestrutura estacionária, quando ocorre a emissão de grande quantidade de dióxido de carbono, como usinas termelétricas por fonte fóssil, plantas de produção de fertilizantes nitrogenados, unidades de processamento de gás natural, polos petroquímicos, siderúrgicos, cimenteiros e refinarias de petróleo. 

Ele acrescenta que o sistema pode ser usado tantos em polos, projetos ou zonas industriais já estabelecidas, quanto em projetos novos, desde que capazes de serem adequados à nova realidade de uma economia de baixo carbono.

“Sabemos que para a concretização do novo mercado, é preciso que haja estabilidade legal, regulatória e institucional para permitir que os agentes envolvidos se comprometam no longo prazo. Digo isso por perceber que, mesmo sendo meritórias, essas tecnologias de baixo carbono, no Brasil, estão longe de um cenário de implantação em larga escala, especialmente no sequestro geológico do carbono. Hoje, apenas alguns campos do pré-sal conseguem desenvolver a atividade de CCS, muito mais devido às restrições no licenciamento ambiental do que pelo caminho do incentivo”, alertou.