A instituição foi a primeira do setor financeiro privado credenciada a oferecer crédito com recursos da Finep para projetos de eficiência energética e acesso à energia de baixo carbono
22 de fevereiro de 2024
Mariza Louven
O Banco Sofisa começa a vender créditos de carbono a pessoas físicas este ano, em sua plataforma digital. A informação é da diretora de ESG (Ambiental, Social e Governança, na sigla em inglês) da instituição, Silvia Scorsato, também presidente do Conselho de Administração da Associação Brasileira de Bancos Comerciais (ABBC).
A primeira casa bancária a ter sua versão digital, o Sofisa Direto, planeja disponibilizar créditos gerados a partir de projetos de terceiros que contribuam para diminuir as emissões dos gases de efeito estufa causadores das mudanças climáticas. A iniciativa segue uma série de medidas ambientais e climáticas já implementadas ou em curso, como a compra de energia renovável para uso próprio no mercado livre, a partir do mês que vem.
Os clientes do Sofisa Direto poderão adquirir títulos que equivalem, unitariamente, a uma tonelada de carbono não emitida ou capturada da atmosfera. Os preços dependem do tipo de projeto a que cada crédito estiver associado.
Em entrevista sobre como o banco que ela dirige e o sistema bancário estão lidando com a emergência climática, Scorsato confirma a vocação do Sofisa para liderar tendências de mercado. Ano passado, foi a primeira instituição privada a ser credenciada para oferecer crédito com recursos da Financiadora de Estudos e Projetos (Finep), do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação.
Os financiamentos serão destinados a apoiar a inovação tecnológica nas empresas, especialmente voltadas para eficiência energética e acesso à energia de baixo carbono.
A descarbonização do Sofisa
Tradicional e, ao mesmo tempo, pioneiro. É assim que Scorsato se refere ao Sofisa, uma instituição com 62 anos no mercado e a primeira do Brasil a ter sua versão digital, em 2011. Esta, segundo ela, já foi uma grande contribuição em termos de enfrentamento das mudanças climáticas. “Ser digital evita deslocamentos, uso de papel e outras atividades que geram emissões de gases de efeito estufa”, afirma.
Desde 2021, o Sofisa se tornou carbono neutro, passando a compensar suas emissões com o apoio de uma climatech brasileira, a Moss. “Fizemos todo o cálculo e neutralizamos por meio da compra de créditos de carbono, com o uso da tecnologia blockchain. A gente também fez essa neutralização em 2022 e, em 2023, coletamos as informações. Vamos finalizar o processo em março”, informa.
Educação climática para pessoas físicas e jurídicas
Este ano, o Sofisa também vai lançar uma plataforma de educação para pessoas físicas e jurídicas, com o objetivo de disseminar boas práticas de responsabilidade socioambiental e climática. Os clientes poderão calcular sua pegada de carbono, de acordo com estilo de vida, hábitos etc. e comprar créditos para neutralizá-la.
Diferente da aquisição de um CDB, por exemplo, que visa exclusivamente o ganho financeiro, a ideia é ajudar os clientes a estimar as emissões e facilitar a compra dos créditos. “É uma forma de estimular o engajamento e apoiar a causa. A gente sabe que tem muita gente querendo comprar e não tem acesso. O viés não é o financeiro. É de retorno para o planeta”, diz ela.
Com base em seu trabalho na ABBC, Scorsato observa que instituições de menor porte, assim como as pessoas, muitas vezes acham que a ação climática é só para os grandes, mas estão enganadas: “Todos têm oportunidade de compensar suas emissões.”
O Sofisa tem apoiado projetos como os que são financiados por uma captação internacional, feita em 2021, junto ao Development Finance Corporation, um banco de desenvolvimento dos Estados Unidos. Parte dos recursos, com taxas mais acessíveis, é destinada a pequenas e médias empresas situadas na Amazônia Legal.
A iniciativa possibilitou ao Sofisa a mais do que dobrar sua carteira de clientes na região. Para acessar os recursos, basta acessar o Sofisa Direto e fazer jus aos requisitos.
A pauta ambiental merece mais atenção
Scorsato admite que os bancos ainda dão menos atenção aos aspectos climáticos, em comparação a outras igualmente importantes pautas da agenda ESG.
A governança está afeita à própria estrutura do mercado financeiro, que é totalmente regulado e baseado na solidez, na confiabilidade etc. Segundo ela, as melhores práticas de governança sempre foram o core do sistema financeiro. “É incontestável. Ele não existe sem a governança. Este já era um pilar muito forte no mercado.”
Quanto à questão social, também é mais fácil ser trabalhada por qualquer empresa que lida com colaboradores internos e clientes. Está diretamente ligada ao negócio e enseja iniciativas para melhoria do bem-estar, diversidade, inclusão etc. O Sofisa já fez captações de recursos, por exemplo, para emprestar especificamente a empresas lideradas por mulheres.
A questão climática, porém, não está tão dentro das atividades rotineiras dos bancos. Mas, segundo ela, isso tende a mudar: “é uma questão que ainda precisa ser, de fato, melhor trabalhada.”
Qual é o poder climático dos bancos?
O grande poder que o mercado financeiro tem é de destinar recursos para projetos da economia verde, troca da matriz energética, eficiência energética, transporte limpo etc.
Em contrapartida, segundo Scorsato, os bancos tendem a subir o patamar de requisitos para a concessão de empréstimos, exigindo mais responsabilidade socioambiental e climática dos seus clientes. “Num determinado momento, quem não tiver melhores práticas socioambientais não vai ter acesso a crédito. O poder do banco é estar com o dinheiro disponível e conseguir elevar a régua, o patamar para a concessão de empréstimos”, acrescenta.
No Sofisa, assim como em outras instituições, a análise tende a ser cada vez mais criteriosa para a concessão de crédito, dependendo do segmento empresarial e da classificação do risco ambiental e climático a que ele está afeito.
A ideia não é simplesmente deixar de conceder o crédito, o que segundo ela poderia inviabilizar a transição para a economia de baixo carbono e prejudicar a economia, mas induzir as empresas a evoluírem.
Scorsato lembra que o Banco Central incluiu a questão climática na gestão integrada de risco dos bancos. Antes, essas instituições tinham que lidar com o risco socioambiental, de maneira geral. Agora, têm também o socioambiental e o climático, especificamente. Existem ainda algumas iniciativas, não obrigatórias, para que os bancos comecem a fazer o monitoramento das emissões de gases de efeito estufa de seus clientes.
Sobre a regulamentação do mercado de carbono, em tramitação no Congresso Nacional, Scorsato diz que vai criar oportunidades e desafios para o sistema bancário. O mercado regulado e mais transparente deve gerar possibilidades de financiar mais projetos e também desafios internos. As instituições terão que fazer uma gestão adequada dos riscos ambientais e climáticos de suas carteiras.
Segundo Scorsato, o Sofisa tem participado de grupos de trabalho do governo e na ABBC, para discutir a regulação do mercado de carbono. Os bancos também vêm se preparando para chegar com propostas na COP30, ano que vem, em Belém.
A ABBC firmou uma parceria com o International Finance Corporation (IFC), maior instituição de desenvolvimento global focada no setor privado, para treinamento de suas 120 associadas. Os cursos tratam, principalmente, de contabilidade climática, gestão, transparência, associação do tema à estratégia de negócio e engajamento.